Acesso ao celular encontrado na cena do crime sem autorização judicial

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Afinal…

Pode ou não pode acessar os dados do celular encontrado fortuitamente na cena do crime?

Bem, antecipamos que o tema ainda não está definido, mas precisamos acompanhar de perto. 

Siga a linha conosco!

Antes de tudo, vamos relembrar o fato submetido à análise do STF:

O MPRJ interpôs RE contra decisão proferida em apelação, na qual o TJRJ absolveu o réu, condenado por roubo duplamente circunstanciado (uso de arma de fogo e concurso de agentes).

O réu ameaçou e agrediu a vítima saindo da agência bancária para roubar sua bolsa. 

Ao fugir numa motocicleta, o telefone caiu e foi pego por policiais civis. 

Eles entraram na memória do aparelho e encontraram fotos capazes de nortear as diligências que resultaram na identificação e prisão do acusado no dia seguinte.

No extraordinário, o MPE-RJ sustenta a validade da prova, e requer o provimento do pedido recursal. 

Argumentou que o acesso às informações e registros contidos no celular não agride o sigilo das comunicações telefônicas, diante do dever da autoridade policial em apreender os instrumentos e objetos do crime.

A repercussão geral do tema foi reconhecida, para aferir sobre:

(24/11/2017)

O min. Dias Toffoli, relator do caso, inicialmente posicionou-se pela licitude da prova, dando provimento ao RE, propondo a seguinte tese:

“É lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro telefônico ou agenda de contatos de celular apreendido ato contínuo no local do crime atribuído ao acusado, não configurando esse acesso ofensa ao sigilo das comunicações, à intimidade ou à privacidade do indivíduo (CF, art. 5º, X e XII).”

 Os Ministros Gilmar Mendes e Edson Fachin abriram a divergência, propondo tese divergente, verbis:

“O acesso a registro telefônico, agenda de contatos e demais dados contidos em aparelhos celulares apreendidos no local do crime atribuído ao acusado depende de prévia decisão judicial que justifique, com base em elementos concretos, a necessidade e a adequação da medida e delimite a sua abrangência à luz dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade e ao sigilo das comunicações e dados dos indivíduos (CF, art. 5º, X e XX)”.

Na sessão virtual iniciada em abril 2024, o relator alterou seu voto para aderir à divergência do Min. Gilmar Mendes:

“refletindo novamente sobre a matéria de fundo, à luz das valiosas considerações contidas no voto divergente do Ministro Gilmar Mendes e das alterações legislativas posteriores, em especial a recente EC 115/2022, revejo meu posicionamento original, …”

Dessa forma, propôs nova tese, a saber:

“1. O acesso a registro telefônico, agenda de contatos e demais dados contidos em aparelhos celulares apreendidos no local do crime atribuído ao acusado depende de prévia decisão judicial que justifique, com base em elementos concretos, a necessidade e a adequação da medida e delimite a sua abrangência à luz dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade, ao sigilo das comunicações e à proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais (CF, art. 5º, X, XII e LXXIX). 

2. Em tais hipóteses, a celeridade se impõe, devendo a Autoridade Policial atuar com a maior rapidez e eficiência possíveis e o Poder Judiciário conferir tramitação e apreciação prioritárias aos pedidos dessa natureza, inclusive em regime de Plantão.”

(voto vista Min. Dias Toffoli – abril 2024)

Na sessão virtual de abril/2024, o julgamento foi novamente suspenso por pedido de vista do Min. André Mendonça; na sessão de set/2024, o Min. Cristiano Zanin pediu vista.

Em nova sessão virtual – agora em março/2025, o Min. Cristiano Zanin acompanhou o novo posicionamento do relator, com algumas ressalvas, sugerindo a seguinte tese:

“1. O acesso a dados obtidos a partir de aparelhos celulares depende do consentimento do titular dos dados ou de prévia decisão judicial (arts. 7º, III, e 10, § 2º, da Lei n. 12.965/2014) que justifique, com base em elementos concretos, a proporcionalidade da medida e delimite sua abrangência à luz dos direitos fundamentais à intimidade, à privacidade, à proteção dos dados pessoais e à autodeterminação informacional, inclusive nos meios digitais (art. 5º, X e LXXIX, CR).

2. A apreensão do aparelho celular, nos termos do art. 6º do CPP, ou em flagrante delito, não está sujeita à reserva de jurisdição.   

3. Nas hipóteses de acesso não consentido a dados de telefone celular, a celeridade se impõe, devendo a autoridade policial atuar com a maior rapidez e eficiência possível e o Poder Judiciário conferir tramitação e apreciação prioritárias aos pedidos dessa natureza, inclusive em regime de plantão. Apenas excepcionalmente será possível a preservação dos dados e metadados do titular do dispositivo, antes da autorização judicial, caso em que a autoridade policial deve:

(i) justificar o fundado receio de que os dados sejam eliminados pelo seu titular ou por terceiros e

(ii) demonstrar, por meios técnicos, que não foi realizado nenhum outro tratamento desses dados.”

Por seu turno, o Min. Luís Roberto Barroso lavrou voto divergente, dando provimento ao recurso do MP e fixando a seguinte tese:

“A autoridade policial pode examinar, independentemente de autorização judicial, os registros das últimas chamadas e a agenda de contatos telefônicos armazenados em aparelho celular abandonado pelo acusado no local do crime.”

Depois de tantas idas e vindas, o Min. Flávio Dino destacou o processo para julgamento no plenário presencial.

Eis que, em 21/05, nova reviravolta…

O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao recurso extraordinário, considerando válido o acesso ao celular à margem de decisão judicial. 

Ou seja, no caso concreto, o acesso foi válido, mas a tese de repercussão geral ficou para ser definida em outra data.

O que (achamos que) sabemos até agora, é que:  

1 – O posicionamento lavrado na sessão restringiu-se apenas ao caso concreto;

2 – O STF ainda deverá definir quanto à validade das provas obtidas por meio de perícia realizada sem autorização judicial em celular encontrado por acaso na cena do crime.

3 – O ministro Luís Roberto Barroso defende uma tese mais abrangente, permitindo acessar os dados de aparelhos encontrados fortuitamente na cena do crime.

Todavia, limita o acesso à identificação do autor do delito, sem que o conteúdo do aparelho seja vasculhado para outros fins.

4 – Os ministros Nunes Marques e Flávio Dino posicionaram-se pela necessária delimitação de acesso, sob pena de permitir agressão aos direitos à intimidade e à privacidade, garantidos pela Constituição.

O que se sabe, de fato, é que NÃO HÁ PREVISÃO PARA QUE A DISCUSSÃO VOLTE AO PLENÁRIO.

Mas nós estamos de olho 👀.

Para acessar as decisões contendo o acórdão de repercussão geral, o voto reajustado do ministro relator e o voto do ministro presidente, clique aqui. 

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@academiacriminaloficial