1º de dezembro de 2025 Edição 056
TESE DEFENSIVA
1. STJ – Tribunal do Júri – Embriaguez ao volante não demonstra dolo eventual
O Ministro Rogério Schietti reafirmou o entendimento de que a embriaguez ao volante, por si só, não basta para demonstrar o dolo eventual para levar o caso ao julgamento pelo Tribunal do Júri.
Em decisão monocrática, o Ministro concluiu pela inexistência de outros elementos aptos a indicar a assunção de risco de matar e despronunciou o réu.
Sendo assim, o caso deixou de ser da competência do Tribunal do Júri e o acusado será julgado por homicídio culposo na condução de veículo automotor.
Entenda o caso:
O réu foi denunciado por homicídio qualificado, sob a alegação de que estava conduzindo veículo em uma estrada vicinal após ingerir bebida alcoólica. A vítima, que trafegava de bicicleta, foi atingida e arremessada a uma distância de mais de 20 metros.
O acidente ocasionou o seu falecimento.
Em primeiro grau, houve sentença de pronúncia, sob o argumento de haver indícios de dolo eventual, considerando a ingestão de álcool, a dinâmica do acidente e a distância em que o corpo foi arremessado.
O Tribunal estadual manteve a decisão, entendendo que caberia ao júri avaliar se houve dolo.
Recorrendo ao STJ, a Defesa sustentou que a embriaguez, por si só, não permite presumir dolo eventual, pedindo a desclassificação para homicídio culposo, conforme o art. 302, §3º, do CTB.
Analisando o pleito recursal, o ministro Rogério Schietti Cruz destacou que a definição entre dolo eventual e culpa consciente em crimes de trânsito exige avaliação cuidadosa dos fatos:
“Em verdade, é tormentosa a delimitação da fronteira divisória entre dolo eventual e culpa consciente na teoria do crime, máxime em hipóteses de homicídios causados na direção de automóvel.”
Ele reiterou que a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a embriaguez, sozinha, não caracteriza dolo eventual, sendo necessário que outras circunstâncias revelem a aceitação do risco de matar.
“Sob essas premissas, verifico que as instâncias ordinárias não apontaram nenhum elemento concreto na conduta do réu, além da embriaguez, que evidenciasse a possibilidade de ele haver agido com dolo eventual.”
Com esse entendimento, despronunciou o réu e determinou a remessa do processo à Justiça comum para o processamento pela modalidade culposa.
Acesse a decisão monocrática aqui.
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JULGADOS + QUE IMPORTANTES
2. STJ – Carta psicografada é inadmissível e deve ser desentranhada
A Sexta Turma do STJ, no RHC 167478, determinou o desentranhamento de uma carta psicografada apresentada pela acusação.
No caso, uma suposta mensagem de pessoa falecida obtida via médium foi considerada prova válida tanto em primeiro como em segundo grau de jurisdição.
A controvérsia chegou ao STJ, o qual entendeu que a mensagem carece de confiabilidade mínima e não pode ser aceita como prova judicial, sob pena de contrariar a racionalidade exigida na apuração dos fatos.
O relator Min. Rogerio Schietti destacou que, embora não se trate propriamente de prova ilícita (não há ilegalidade na obtenção), tal elemento é irrelevante e incapaz de esclarecer os fatos de forma racional.
Portanto, vale notar que a obtenção de uma carta psicografada não viola nenhuma norma de direito material ou processual. Tão somente a valoração (positiva) dessa prova é que violaria o direito a um julgamento racional.
Assim, não estamos diante de um vício de licitude, já que obtenção dessa prova é lícita e legítima. O vício está na fiabilidade dela (relevância epistemológica).
Essa distinção é relevante, pois a ilicitude da prova acarreta a ilicitude das provas dela derivadas, na forma do art. 157, § 1º, do CPP, mas não a falta de fiabilidade.
Assim, cartas psicografadas e denúncias anônimas não têm valor probatório, mas podem ter valor investigativo.
Vale dizer: o conteúdo da informação constante da carta psicografada ou da denúncia anônima pode ser apurado por outros meios de obtenção de prova na fase de investigação preliminar.
O fundamento primordial da inadmissibilidade da carta psicografada consiste, repita-se, na absoluta inidoneidade epistêmica da psicografia como meio de prova.
Por conseguinte, no processo submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, é imperativo o seu desentranhamento dos autos, a fim de evitar que seja valorada pelos jurados e conduza a julgamentos irracionais.
RHC 167478
Acórdão ainda não foi publicado.
3. REPERCUSSÃO GERAL e REPETITIVOS
Tema 1.347 – STJ – Regressão cautelar de regime prisional pode ser aplicada sem a prévia oitiva do apenado
Sob o rito dos recursos repetitivos, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça estabeleceu:
“A regressão cautelar de regime prisional é medida de caráter provisório e está autorizada pelo poder geral de cautela do juízo da execução, podendo ser aplicada, mediante fundamentação idônea, até a apuração definitiva da falta”.
Com a fixação da tese no regime dos repetitivos, esse entendimento – que já estava consolidado na jurisprudência do STJ – deverá ser observado pelos juízes e tribunais de todo o país na análise de casos semelhantes, como manda o artigo 927 do Código de Processo Civil (CPC).
Segundo o relator do repetitivo, ministro Og Fernandes, a regressão cautelar tem natureza processual, semelhante à prisão provisória, e deve ser aplicada de forma imediata durante a apuração da falta – o que seria impossível ou inócuo caso se exigisse a prévia oitiva do reeducando.
“Mostra-se inaplicável, portanto, o artigo 118, inciso I e parágrafo 2º, da Lei de Execução Penal (LEP), pois a regressão cautelar é fundamentada no poder geral de cautela do juízo da execução e na necessidade de preservação dos objetivos da execução penal, tais como o da ressocialização do indivíduo”.
RECURSO ESPECIAL Nº 2166900 – SP
PEC’S e ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS
Publicada a 15.272/25, que altera o Código de Processo Penal para:
1 – definir circunstâncias que recomendam a conversão da prisão em flagrante em preventiva;
2 – disciplinar a coleta de material biológico para obtenção de perfil genético de custodiados e
3 – detalhar critérios para aferir a periculosidade do acusado, inclusive nas audiências de custódia.
A lei modifica o artigo 310 do CPP, o qual trata da atuação do juiz após receber o auto de prisão em flagrante, acrescentando dois novos parágrafos ao artigo 310.
O novo § 5º prescreve circunstâncias que, sem prejuízo de outras, recomendam a conversão da prisão em flagrante em preventiva. São elas:
1 – existência de provas que indiquem a prática reiterada de infrações penais pelo agente;
2 – prática de infração penal com violência ou grave ameaça contra a pessoa;
3 – o agente já ter sido liberado em audiência de custódia anterior por outra infração penal, salvo se posteriormente absolvido por esse fato;
4 – prática da infração penal durante a pendência de inquérito ou ação penal;
5 – ocorrência de fuga ou perigo de fuga;
6 – perigo de perturbação da tramitação ou do decurso do inquérito ou da instrução criminal, bem como risco para a coleta, conservação ou incolumidade da prova.
Por seu turno, o novo § 6º do artigo 310 determina que a decisão do juiz, na audiência de custódia, deve ser motivada e fundamentada e torna obrigatório o exame:
1 – das circunstâncias previstas nos §§ 2º e 5º do próprio artigo 310 (como integração em organização criminosa armada, milícia ou reincidência, e o rol de situações que recomendam a conversão em preventiva); e
2 – dos critérios de periculosidade previstos no § 3º do artigo 312, que também foi alterado pela mesma lei (veja mais abaixo).
Dessa forma, a lei vincula a decisão tomada na audiência de custódia a uma análise expressa de elementos concretos ligados ao histórico do agente, às circunstâncias do fato e à sua periculosidade.
A lei ainda incluiu o art. 310-A, para tratar da coleta de material biológico de pessoas presas em flagrante nas seguintes situações:
1 – por crime praticado com violência ou grave ameaça contra a pessoa;
2 – por crime contra a dignidade sexual;
3 – por crime praticado por agente em relação ao qual existam elementos probatórios indicando que integra organização criminosa que utilize ou tenha à sua disposição armas de fogo; ou
4 – por crime previsto no artigo 1º da lei dos crimes hediondos (lei 8.072/90);
O MP ou a autoridade policial deverá requerer ao juiz a coleta de material biológico para obtenção e armazenamento do perfil genético do custodiado, conforme a lei 12.037/09.
A lei 15.272 também acrescenta os parágrafos 3º (que detalha critérios para aferição da periculosidade) e 4º (que veda a decretação da prisão preventiva baseada apenas na gravidade abstrata do crime).
Tenham todos uma ótima semana!
Forte abraço,
Equipe Academia Criminal


