Previsto no Art. 107, inc. IX, do CP, o perdão judicial é um instituto de clemência que permite ao juiz deixar de aplicar a pena ao réu, mesmo após a constatação de sua culpa, operando como causa de extinção da punibilidade.
Um recente levantamento do STJ demonstra que a Corte se mantém rigorosa na sua aplicação, delimitando o benefício de forma estritamente legal.
Analogia afastada
Os julgados analisados evidenciam que as hipóteses de perdão judicial são de natureza taxativa, não estendendo sua aplicação aos casos não previstos expressamente em lei, como em crimes de roubo (AREsp 2.140.215).
Nesse julgado, a Defesa pugnou pela aplicação do instituto ao condenado que, durante a prática do crime de roubo, foi atingido por um tiro disparado por um guarda municipal e, em consequência da lesão, ficou paraplégico. O benefício foi negado.
Limites para aplicação do benefício
A análise subjetiva do abalo emocional suportado pelo acusado é o ponto mais sensível para a concessão do perdão.
O STJ traçou uma linha tênue entre o sofrimento presumido e o sofrimento comprovado nos casos de homicídio culposo:
- Abalo Aceito: No julgamento de um homem condenado por homicídio culposo por matar o próprio irmão por engano (REsp 1.871.697), a 6ª Turma concedeu o benefício.
O relator considerou que o vínculo fraterno e a demonstração da conduta imprudente eram suficientes para justificar a clemência, numa interpretação que busca ser “mais razoável e humana” da lei.
- Sofrimento Não Presumido: Por outro lado, a Corte tem rejeitado a presunção de sofrimento. Em casos de morte de amigo (REsp 1.854.277), o STJ valeu-se da Súm. 7 para decidir que o abalo emocional não restou configurado nas instâncias ordinárias, sendo inviável o reconhecimento na esfera especial.
- No HC 953.524, o STJ ressaltou que o sofrimento insuportável não pode ser presumido apenas pelo parentesco ou amizade entre o autor e a vítima.
O levantamento do STJ também sinalizou os seguintes limites processuais:
- Colaboração Premiada: A colaboração não basta para autorizar o perdão (AREsp 2.452.224). É apenas um dos fatores a serem avaliados, junto à personalidade do colaborador, natureza, circunstâncias e gravidade do fato.
- Concurso Formal: O perdão concedido a um crime não se estende automaticamente a outros delitos praticados em concurso formal (REsp 1.444.699). O benefício deve ser analisado individualmente para cada delito.
- Fase Processual: O perdão judicial não pode ser concedido na fase de admissibilidade da queixa-crime (caso em segredo de justiça, 2020), pois exige, por parte do juiz, uma análise de mérito da ação para só então deixar de aplicar a pena.
O levantamento do STJ evidencia que a aplicação do perdão judicial deve sopesar o sofrimento humano e os limites legais.
Cabe, então, sobretudo à advocacia criminal, refletir: até que ponto a interpretação do perdão judicial tem equilibrado os princípios da legalidade, da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana?
A análise está posta. A discussão permanece aberta.


