Acade-mail Ed. 051

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20 de outubro de 2025                                                               Edição 051

Previsto no Art. 107, inc. IX, do CP, o perdão judicial é um instituto de clemência que permite ao juiz deixar de aplicar a pena ao réu, mesmo após a constatação de sua culpa, operando como causa de extinção da punibilidade. 

Um recente levantamento do STJ demonstra que a Corte se mantém rigorosa na sua aplicação, delimitando o benefício de forma estritamente legal.

Analogia afastada 

Os julgados analisados evidenciam que as hipóteses de perdão judicial são de natureza taxativa, não estendendo sua aplicação aos casos não previstos expressamente em lei, como em crimes de roubo (AREsp 2.140.215). 

Nesse julgado, a Defesa pugnou pela aplicação do instituto ao condenado que, durante a prática do crime de roubo, foi atingido por um tiro disparado por um guarda municipal e, em consequência da lesão, ficou paraplégico. O benefício foi negado. 

Limites para aplicação do benefício

A análise subjetiva do abalo emocional suportado pelo acusado é o ponto mais sensível para a concessão do perdão. 

O STJ traçou uma linha tênue entre o sofrimento presumido e o sofrimento comprovado nos casos de homicídio culposo:

  • Abalo Aceito: No julgamento de um homem condenado por homicídio culposo por matar o próprio irmão por engano (REsp 1.871.697), a 6ª Turma concedeu o benefício. 

O relator considerou que o vínculo fraterno e a demonstração da conduta imprudente eram suficientes para justificar a clemência, numa interpretação que busca ser “mais razoável e humana” da lei.

  • Sofrimento Não Presumido: Por outro lado, a Corte tem rejeitado a presunção de sofrimento. Em casos de morte de amigo (REsp 1.854.277), o STJ valeu-se da Súm. 7 para decidir que o abalo emocional não restou configurado nas instâncias ordinárias, sendo inviável o reconhecimento na esfera especial. 
  • No HC 953.524, o STJ ressaltou que o sofrimento insuportável não pode ser presumido apenas pelo parentesco ou amizade entre o autor e a vítima.

O levantamento do STJ também sinalizou os seguintes limites processuais:

1. Colaboração Premiada: A colaboração não basta para autorizar o perdão (AREsp 2.452.224). É apenas um dos fatores a serem avaliados, junto à personalidade do colaborador, natureza, circunstâncias e gravidade do fato.

    2. Concurso Formal: O perdão concedido a um crime não se estende automaticamente a outros delitos praticados em concurso formal (REsp 1.444.699). O benefício deve ser analisado individualmente para cada delito.

    3. Fase Processual: O perdão judicial não pode ser concedido na fase de admissibilidade da queixa-crime (caso em segredo de justiça, 2020), pois exige, por parte do juiz, uma análise de mérito da ação para só então deixar de aplicar a pena.

    O levantamento do STJ evidencia que a aplicação do perdão judicial deve sopesar o sofrimento humano e os limites legais.

    Cabe, então, sobretudo à advocacia criminal, refletir: até que ponto a interpretação do perdão judicial tem equilibrado os princípios da legalidade, da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana?

    A análise está posta. A discussão permanece aberta.

    Para acessar o levantamento do STJ a respeito do perdão judicial, clique aqui. 

    1. Tutela de urgência em Recurso Especial determina a imediata soltura do réu (ainda o Crime da 113 SUL)

    Estamos acompanhando de perto os desdobramentos do julgamento do Crime da 113 Sul, no qual a 6a Turma do STJ. 

    A Defesa do réu Mairlon Barros Aguiar, sentenciado a 47 anos de prisão (REsp 2232036/DF), protocolou um pedido de “Tutela de Urgência”, pugnando pela imediata soltura do réu, preso há 14 anos. 

    Para tanto, evidenciou o entendimento do STJ quanto ao tema 1.260, cuja tese está sendo fixada no seguinte sentido:

    “Após o voto do Sr. Ministro Relator, dando provimento ao recurso especial, a fim de impronunciar o réu, e fixando a seguinte tese quanto ao Tema Repetitivo n. 1260: “1) A sentença de pronúncia não pode ser fundamentada exclusivamente em elementos colhidos durante o inquérito policial que não tenham sido confirmados em juízo; 2) O testemunho indireto, ainda que colhido em juízo, não constitui meio de prova idôneo para fundamentar a pronúncia”, pediu vista antecipada o Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz.” (12/03/2025).

    Ademais, evidenciou que no julgamento do recurso especial da ré Adriana Vilella (REsp nº 2.050.711/DF), o STJ anulou o júri e todos os atos instrutórios, tendo em vista que as mídias contendo o interrogatório dos corréus foram juntadas apenas no sétimo dia de julgamento em plenário.

    Por isso a Defesa peticionou requerendo “Tutela de urgência”, para que fosse determinada a soltura do réu, o qual deveria aguardar o julgamento em liberdade, ou, eventualmente, suportar medidas alternativas à prisão. 

    O Ministro relator, Sebastião Reis, deferiu o pedido, evidenciando que a decisão de pronúncia, de 2013, submeteu o acusado ao julgamento pelo Júri apenas com base na confissão apresentada pela polícia e no relato dos corréus. Ou seja, o juízo não alinhou esses elementos a outras provas produzidas na fase judicial. 

    Segundo o Ministro, havia depoimentos extrajudiciais que incriminavam o acusado, mas também depoimentos em juízo dos próprios corréus que o inocentavam, cumprindo ao Estado Juiz confrontar esses elementos com as demais provas antes de submeter o acusado ao tribunal do júri.

    “É inadmissível que, no Estado Democrático de Direito, um acusado seja pronunciado e condenado por um tribunal de juízes leigos, apenas com base em elementos de informação da fase extrajudicial, dissonantes da prova produzida em juízo e sob o crivo do contraditório”.

    Em 14/10, sobreveio decisão da 6a Turma, determinando o trancamento da ação penal e a imediata soltura do réu, verbis:

    “A Sexta Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do recurso especial e, nessa extensão, deu-lhe provimento para trancar a Ação Penal n. 2009.01.1.152922-7, da Vara do Tribunal do Júri de Brasília/DF, em relação ao recorrente FRANCISCO MAIRLON BARROS AGUIAR, sem prejuízo de que outra denúncia seja formulada pelo órgão da acusação, desde que mediante suficientes elementos de informação que denotem a existência de indícios de autoria em relação ao recorrente, que deverá ser imediatamente colocado em liberdade“. 

    REsp 2232036 / DF (acórdão ainda não publicado). 

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    2. STJ – Erro de Proibição Afasta Estupro de Vulnerável

    Para a Quinta Turma do STJ, o erro de proibição pode afastar o estupro de vulnerável, desde que haja vínculo afetivo, ausência de violência e conhecimento da família da menor. 

    Todas essas circunstâncias evidenciam ausência de lesão ao bem jurídico tutelado.

    No caso analisado pelo STJ, o réu, com 19 anos, manteve relacionamento com uma menor de 13, com quem teve um filho e manteve relação estável por 18 meses.

    O Tribunal de origem condenou com base no art. 217-A do CP e na súmula 593 do STJ.

    Mas o STJ reconheceu o erro de proibição e aplicou o distinguishing, uma técnica jurídica que permite afastar uma tese consolidada quando as circunstâncias concretas do caso analisado são flagrantemente distintas das circunstâncias do entendimento consolidado.  

    3 pontos-chave do julgado:

    • A aplicação do entendimento sumular não dispensa a análise das circunstâncias específicas do caso concreto
    • O caso demonstrou um relacionamento de 18 meses, com o conhecimento da família da menor, e com a existência de um filho reconhecido afetivamente e materialmente pelo réu
    • A condenação do pai traria mais prejuízo à criança do que a absolvição.

    Tema delicado, mas essencial para refletir sobre o erro de proibição e aplicação dos entendimentos sumulados.

    Processo em segredo de justiça. 

    3. TEMA 1.382 – STJ – Licitude da Prova decorrente da quebra de sigilo telemático

    A 3ª Seção acolheu a proposta de afetação do REsp 2.052.194-MG ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: 

    “definição da licitude da prova decorrente de quebra de sigilo telemático, por meio de espelhamento de aplicativo de transmissão de mensagens”.

    Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz

    j. 9/9/2025, DJEN 18/9/2025

    4. TEMA 1.383 – STJ – Penhora do pecúlio 

    A 3ª Seção acolheu a proposta de afetação do REsp 2.204.874-SP, REsp 2.195.564-SP e REsp 2.206.612-SP ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da seguinte controvérsia: 

    “definir se é possível a penhora de pecúlio do condenado para pagamento de pena de multa, diante da alegação de impenhorabilidade das verbas de natureza alimentar”.

    Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz

    j. 9/9/2025, DJEN 19/09/2025.

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