Julgamento de réu com base em testemunho de “ouvi dizer” é considerado ilegal, decide STJ

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O ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), anulou a decisão de pronúncia de um homem acusado de homicídio duplamente qualificado e ocultação de cadáver, ao entender que submetê-lo ao Tribunal do Júri com base apenas em testemunhos indiretos configura constrangimento ilegal.

A decisão foi tomada de ofício durante o julgamento de um Habeas Corpus, que apontava a ausência de provas consistentes da participação do réu no crime. A medida foi adotada poucos dias antes do início do julgamento, no qual o acusado seria julgado junto com outros dois denunciados.

De acordo com os relatos, o réu e outro indivíduo estariam em um local conhecido por ser ponto de venda de drogas, no momento em que a vítima e um amigo chegaram para comprar entorpecentes. Devido a uma dívida, os supostos traficantes se recusaram a vender. A vítima teria causado um tumulto e, durante a confusão, um terceiro indivíduo apareceu e efetuou os disparos que levaram à morte da vítima.

A denúncia foi fundamentada pelo delegado responsável, que mencionou o envolvimento do acusado com base em declarações de testemunhas. No entanto, ao ser questionado em audiência sobre quem teria fornecido essa informação, o delegado afirmou não se lembrar e não soube identificar a fonte exata do relato.

A defesa argumentou que se tratava de uma prova indireta, baseada em comentários de terceiros, sem qualquer comprovação concreta. Além disso, nenhuma das testemunhas ouvidas durante a investigação ou em juízo confirmou a versão do delegado.

Ao analisar o caso, o ministro Ribeiro Dantas destacou que a única justificativa para a pronúncia foi a presença do acusado no local do crime — fato que ele nunca negou. “Não há qualquer elemento concreto que aponte sua participação nos atos criminosos”, afirmou.

O ministro ressaltou também o depoimento da única testemunha ocular, que acompanhava a vítima no momento do crime. Essa testemunha não apenas deixou de apontar qualquer conduta criminosa do réu, como também afirmou com convicção que não o viu no momento dos disparos ou das agressões. Para Ribeiro Dantas, essa declaração tem especial relevância, já que a testemunha presenciou toda a sequência dos acontecimentos até conseguir fugir.

Diante da fragilidade das provas, o ministro concluiu: “Submeter o paciente a julgamento pelo Tribunal do Júri com base apenas em suposições e testemunhos de ouvir dizer, sem nenhuma evidência concreta de autoria, configura constrangimento ilegal, corrigível por meio do Habeas Corpus.”

Atuaram na defesa do acusado os advogados Ana Paula Krug e Gustavo Bretana.

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@academiacriminaloficial